Autoriza alienação de bens públicos, por doação com encargos, mediante concorrência, revoga expressamente o item 09 do art. 3º da Lei nº 3.197, de 11 de dezembro de 1989, revoga expressamente a Lei nº 5.290, de 10 de dezembro de 1996 e dá outras providências.
Sorocaba, 29 de maio de 2014.
SEJ-DCDAO-PL-EX-071/2014
Processo nº 6.976/2013
Excelentíssimo Senhor Presidente:
Sirvo-me do presente para encaminhar à apreciação e deliberação de Vossa Excelência e Dignos Pares, o incluso Projeto de Lei que dispõe sobre autorização para que o Município proceda à alienação de bens públicos, por doação com encargos, mediante concorrência, revoga expressamente o Item 9 do art. 3º da Lei nº 3.197, de 11 de dezembro de 1989, revoga expressamente a Lei nº 5.290, de 10 de dezembro de 1996 e dá outras providências.
Como é cediço, o art. 111 da Lei Orgânica do Município, determina que a alienação de bens municipais, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será sempre precedida de avaliação e quando imóveis, dependerá de autorização legislativa e concorrência, sendo esta dispensada, tratando-se de doação, quando deverá constar obrigatoriamente do contrato os encargos do donatário, o prazo de seu cumprimento e a cláusula de retrocessão, sob pena de nulidade do ato.
Também a Lei Federal nº 8.666/93 (Lei de Licitações), que reserva especificamente a Seção VI sobre bens da Administração Pública e elenca todos os requisitos para sua efetivação, dispõe em seu art. 17, o seguinte:
"Art. 17 – A alienação de bens da Administração Pública, subordinado à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação prévia e obedecerá as seguintes normas:
I – quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e para todos inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação previa e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:
....
§ 4º – a doação com encargo será licitada e de seu instrumento constarão obrigatoriamente os encargos, o prazo de seu cumprimento e cláusula de reversão, sob pena de nulidade do ato, sendo dispensada a licitação o caso de interesse público devidamente justificado".
Conforme se observou, tanto a Lei Orgânica do Município como a Lei de Licitações determinam expressamente que em caso de alienação de área o interesse público deve ser plenamente justificado, pois caso contrário esta não será possível. E, ainda que haja interesse público devidamente justificado, a licitação é de rigor na modalidade de concorrência, já que a doação só poderá ser adotada em casos específicos em função das circunstâncias, que dependerão da relevância do interesse publico e não do interesse pessoal, ainda que este por via oblíqua possa trazer benefícios à comunidade.
A Lei de Licitações que é inclusive posterior à Lei Orgânica do Município, tem perfil Constitucional e dele não pode se afastar sob pena de incorrer em ilegalidade, conforme ensina Seabra Fagundes na obra “Controle Jurisdicional dos Atos Administrativos”, verbis:
“A eficácia e a validade de toda atividade administrativa estão condicionadas ao atendimento da lei. Na Administração Pública, não há liberdade pessoal. Enquanto que na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. (Ed. Forense 5° edição, pp. 4/5)".
Analisando a Constituição Federal (Inciso XXI do art. 37) percebe-se que há disposição expressa sobre a realização de certame, sendo o mesmo obrigatório, não podendo ficar ao alvedrio do Administrador dispor sobre as hipóteses de dispensa, mesmo porque em sede de Direito Administrativo, aquilo que não está expressamente permitido é proibido, ao contrário do direito privado, onde o que não está proibido é permitido.
O citado Inciso XXI do art. 37 dispõe:
“Art. 37 – A Administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
...
XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações".
Justamente por esse perfil Constitucional é que os regramentos da licitação se impõem, pois é ela que resguarda os princípios constitucionais, aliás repetidos no art. 3° da Lei nº 8.666/93, que ora transcrevo:
"Art. 3º – A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos".
Este é o mais importante artigo da Lei de Licitações, que dispõe sobre as contratações com a Administração Pública. Tanto que os mestres da doutrina recomendam que em caso de dúvidas nos outros dispositivos quanto à aplicação e interpretação, o Administrador deve verificar se a conduta está de acordo com este artigo, conforme preleciona Marçal Justem Filho, em sua obra Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, verbis:
"Esse artigo apresenta excepcional relevância, devendo-se reconhecer-se a ele um destaque superior aos demais dispositivos da lei: O art. 3° consagra os princípios norteadores da licitação.
O art. 3° sintetiza o conteúdo da Lei no âmbito da licitação. Os dispositivos restantes, acerca da licitação, desdobram os princípios do art. 3°, que funciona como norteador do trabalho hermenêutico e de aplicação da Lei das Licitações. Nenhuma solução, em caso algum, será sustentável quando colidente com o art. 3°. Havendo dúvida sobre o caminho a adotar ou a opção a preferir deverá o intérprete recorrer a esse dispositivo. Dentre diversas soluções possíveis, deverão ser rejeitadas as incompatíveis com os princípios do art. 3°. Se existir mais de uma solução compatível com ditos princípios deverá prevalecer aquela que esteja mais de acordo com eles ou que os concretize de modo mais intenso e amplo". (pág. 54, Editora Dialética, 5ª edição)
Segundo ainda o eminente jurista supracitado:
"Sempre que a contratação não caracterizar uma "escolha" ou "preferência" da Administração por uma dentre diversas alternativas, será desnecessária a licitação". (pág. 43)
Nesse diapasão, a alienação de qualquer espaço que se destine a fins comerciais deve obedecer às regras da licitação, já que em tese outros possíveis interessados poderiam também querer se utilizar desse mesmo espaço para suas atividades, muito embora também a população possa ser beneficiada com a criação de novos empregos, existindo também, no caso o interesse público.
Entretanto, este, por si só, não autoriza a dispensa, eis que a cima dele estão os princípios constitucionais da moralidade, probidade administrativa, e legalidade, igualdade e isonomia, que determina a obediência ao Estatuto das Licitações e Contratos, princípios esses que se constituem em dever de todo Administrador de coisas públicas.
Verifica-se assim, que todos os casos de alienação na acepção ampla da palavra, que abrange todos os casos de transferência voluntária do domínio Público, quer seja investidura, permuta, venda, ou doação que também são institutos do direito privado no direito público, se regem por normas próprias e só subsidiariamente se aplicam também as disposições do direito privado.
Ao promover a licitação, a Administração terá cuidado em exigir requisitos mínimos de garantia no Edital, para que os interessados apresentem suas propostas, conforme ato convocatório, com condições gerais e específicas, o que será, posteriormente, definido pela Secretaria competente.
Levando-se em consideração que o presente Projeto versa sobre alienação de bens públicos deve-se trazer à baila o ensinamento do mestre Hely Lopes Meirelles na obra “Direito Administrativo Brasileiro” 27ª edição – Editora Malheiros, quando preleciona sobre administração dos bens públicos:
“No conceito de administração de bens compreende-se, normalmente, o poder de utilização e conservação das coisas administradas, diversamente da ideia de propriedade, que contém, além desse, o poder de oneração e disponibilidade e a faculdade de aquisição. Daí por que os atos triviais de administração, ou seja, de utilização e conservação do patrimônio público, independem de autorização especial, ao passo que os de alienação, oneração e aquisição exigem, em regra, lei autorizadora e licitação para o contrato respectivo” (ob. cit. pág. 489).
Mais adiante, quando discorre sobre alienação dos bens públicos, o mesmo autor ensina:
“A administração dos bens públicos compreende normalmente a utilização e conservação do patrimônio público, mas, excepcionalmente, pode a Administração ter necessidade ou interesse na alienação de alguns de seus bens, caso em que deverá atender à exigências especiais impostas por normas superiores. É o que veremos a seguir.
Alienação – Alienação é toda transferência de propriedade, remunerada ou gratuita, sob a forma de venda, permuta, doação, dação em pagamento, investidura, legitimação de posse ou concessão de domínio. Qualquer dessas formas de alienação pode ser utilizada pela Administração, desde que satisfaça as exigências administrativas para o contrato alienador e atenda aos requisitos do instituto específico. Em princípio, toda alienação de bem público depende de lei autorizadora, de licitação e de avaliação da coisa a ser alienada, mas casos há de inexigibilidade dessas formalidades, por incompatíveis com a própria natureza do contrato” (ob. cit. pág. 502).
Ainda por se estar frente ao instituto da doação, pertinente que a mesma seja conceituada. Para De Plácido e Silva (Vocabulário Jurídico, 12ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1993, vol. II, p. 116):
“Doação, derivado do latim donatio, de donare (dar, brindar, presentear), bem exprime o vocábulo, por sua etimologia, o ‘ato de liberalidade’, pelo qual a pessoa ‘dispõe’ de bens ou vantagens integradas em seu patrimônio em benefício de outrem, que os aceita”.
Segundo ainda o mesmo autor:
“O que se pode ter é a doação com encargos ou onerosa, em que se vincula a doação a determinado ônus a ser suportado pelo donatário, como, por exemplo, quando se impõem restrições ao uso ou disposição da coisa doada ou quando se estabelece a cláusula de reversão do bem ao patrimônio público, ante o não cumprimento dos encargos pelo donatário”.
Por fim, cumpre observar que em 1989, a Municipalidade, com o beneplácito dessa E. Câmara fez editar a Lei nº 3.197, de 11 de dezembro de 1989, a qual autorizou a doação de bens imóveis à empresas industriais para implantação de distrito industrial. Pelo Item 09 do art. 3º da citada Lei a área objeto do presente Projeto de Lei foi doada à empresa Politecno Caldeiraria Indústria e Comércio Ltda. À época, dentre as obrigações impostas às empresas constava a de iniciar a construção do prédio no prazo de 06 (seis) meses a contar da outorga da escritura e iniciar a atividade industrial no respectivo imóvel no prazo de 18 (dezoito) meses, prazo esse contado também da escritura. Já, em 1996, editou-se a Lei nº 5.290, de 10 de dezembro, prorrogando em 01 (um) ano, o prazo para a empresa em questão iniciasse as obras, prazo esse que contaria da data do término do prazo previsto anteriormente. No entanto, fiscalização efetuada na área constatou que a empresa descumpriu os termos da lei, eis que não deu início à construção, no prazo determinado.
Em razão disso, há necessidade de se revogar expressamente o Item 9 do art. 3º da Lei nº 3.197, de 11 de dezembro de 1989 e ainda, de revogar-se expressamente a Lei nº 5.290, de 10 de dezembro de 1996, o que se propõe também no presente Projeto de Lei.
Diante de todo o exposto é perfeitamente legal a apresentação do presente, estando o mesmo plenamente justificado diante da relevância que representa ao Município.
Ao ensejo, reitero protestos de elevada estima e consideração, na certeza de que o mesmo será acolhido por essa D. Casa.